Como gente da roça, senhor Onofre e senhora Maria eram extremamente supersticiosos. Durante todos estes anos fizeram mandingas para que a barriga da mulher trouxesse à luz um filho homem, que honrasse o trabalho do pai. Mas nada funcionara.
Ao nascer da sétima filha, o primeiro pensamento que tiveram era de que eles foram destinados a comandar aquele harém caseiro e nunca Deus lhes daria um varão para ajudá-los nesta empreita. Porém, passados alguns meses do cansaço devido aos cuidados da recém-nascida, um pensamento temeroso despontou nos dois.
Supersticiosos, como já citei, lembraram de uma lenda muito difundida. Comentaram a história vez ou outra na quarta, quinta ou sexta vez em que Maria ficou grávida, mas nunca se preocuparam tanto quanto agora. Diziam pelas redondezas que, após o nascimento de sete filhas, sendo o oitavo homem, este se tornará lobisomem.
O pavor tomou conta do casal. Mantiveram distância na cama durante meses afinco. Abstenção completa de atos reprodutivos. Pensaram até em capar senhor Onofre, para evitar qualquer eventualidade. O medo de um filho beijado pelo diabo era o único pensamento que tinham. Enquanto isso, as filhas mais velhas aproveitam as paqueras no portão de casa.
Foram consultar o padre.
Homem sábio, temente a Deus, ministro do Evangelho e serviçal da pequena comunidade rural, padre Tinho, como era conhecido, atendeu-os na capelinha calorosamente. Comoveu-se com a ingenuidade do casal e aconselhou-os a não se preocuparem com nada. Tirou da idéia dos dois de caparem o pobre coitado e disse a eles que mau nenhum havia em continuarem se amando em casa. Deus castiga aqueles que o afrontam. Sendo pessoas boas, maldição alguma os afligiria.
Voltaram para casa, não completamente reconfortados, mas, com certeza, mais tranqüilos. Demoraram ainda para recomeçarem a se abraçar debaixo dos lençóis. Tinham em mente, também, que ambos só poderiam gerar filhas, moças de extrema beleza, e essa era a missão divina a eles dada. Impossível que, se por algum acaso ainda viesse nova descendência, fosse homem.
E mais um ano inteiro se concluiu. Senhor Onofre chega em casa e a filharada brigando na sala, alguma coisa com um namorado em comum entre a primeira e a terceira filha. Ele interrompe a discussão e manda todas para o quarto, ordenando que elas aguardem para ouvirem um bom sermão e, muito provavelmente, um castigo. Cessado o tumulto, o pai da família procura sua mulher, querendo uma explicação.
A encontra no quarto, chorando, mãos acariciando a barriga. O marido senta ao seu lado na beira da cama e a abraça.
“Espero que seja outra mulher, meu bem”, são as palavras da esposa, entrecortadas por soluços chorosos.
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